Crítica: guerra civil é uma carta de amor ao jornalismo e à democracia, no tempo e na hora certos. O showmetech foi convidado pela diamond films na última sexta (5) a conferir guerra civil nos cinemas; o filme chega dia 18 de abril em todo brasil.

CRÍTICA: Guerra Civil é uma carta de amor ao jornalismo e à democracia, no tempo e na hora certos

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O Showmetech foi convidado pela Diamond Films na última sexta (5) a conferir Guerra Civil nos cinemas; o filme chega dia 18 de abril em todo Brasil.

Que a A24 passou de ser uma produtora independente, todo bom cinéfilo sabe. A qualidade dos filmes produzidos pelo estúdio é irrefutável. E para agora, abril, a A24 traz Guerra Civil (Civil War), filme mais caro do estúdio — custando US$50 milhões — e com a maior estreia da produtora nos cinemas — registrando em seu primeiro fim de semana nos EUA entre 15 a 20 milhões de dólares — com um elenco super qualificado, embora muito aleatório.

Kirsten Dunst (Mary Jane da trilogia Homem-Aranha de Sam Raimi), o brasileiro Wagner Moura (Narcos), Jesse Plemons (Breaking Bad), Cailee Spaeny (Priscilla), Nick Offerman (The Last of Us) e Stephen Henderson (Duna: Parte Dois) compõem o elenco do filme ficcional, mas não tão fantasioso assim, o que gerou polêmica e uma curiosidade positiva no mundo do cinema.

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Programado para chegar aos cinemas na quinta-feira (18), pela Diamond Films, o Showmetech viu antecipadamente o filme e traz a crítica de Guerra Civil sem spoilers para você abaixo.

História e Personagens

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Imagine um Estados Unidos cujo presidente, como resposta por não obter apoio mandatário da Califórnia, Flórida e Texas, decide dissolver a Constituição Americana e desunir os Estados, usando o Exército contra os “falsos americanos” opressores, diante de toda a potência bélica de um país de “primeiro mundo”. Mísseis, fuzis, granadas, tanques… um país fraturado que demonstra conformidade e normalidade em meio à própria ruína e barbárie. A trama de Guerra Civil, sob olhar do diretor e roteirista Alex Garland (Ex Machina), seria um filme bastante criativo e fora da curva se não fosse a dura realidade fora das telas.

Por mais que toda a atmosfera de Guerra Civil circunde no conflito entre os Estados, o que dita o filme é outra narrativa. A história em si gira em torno de uma equipe de fotojornalistas, cuja missão é viajar a milhares de quilômetros até a capital americana para entrevistar o Presidente, que, pela situação da guerra, está com seus dias contados.

Com um país em situação de guerra, o time faz uma road trip — viagem de carro — até o destino, se deparando com estradas abandonadas, paralisadas e cheia de emboscadas, e encontrando, consequentemente, desde inocentes cidadãos que só querem viver suas vidas com normalidade a outros que usam da precariedade da guerra para ditar espaços e pessoas como bem entender.

Terceiro trailer de Guerra Civil dublado. (Vídeo: Reprodução/A24/Diamond Films)

Kirsten Dunst é a experiente e famosa fotojornalista Lee, com uma carreira brilhante e que lhe custou amargura e desesperança com a humanidade. Wagner Moura é o carismático e viciado pela adrenalina da cobertura de catástrofes Joe, repórter que trabalha há tempos com Lee na cobertura da Guerra Civil.

Como coadjuvantes da equipe, a jovem Cailee Spaeny é Jesse, uma menina de 23 anos que admira o legado de Lee e deseja seguir os mesmos passos, fotografando de maneira independente e depois recrutada à equipe por Joe — mesmo contra vontade da personagem de Kirsten Dunst; e o experiente jornalista da New York Times Sammy (interpretado por Stephen Henderson), que, a princípio, não se juntaria ao time por achar uma ação “suicida”, mas acaba cedido por Lee. Por sua vez, Nick Offerman interpreta o Presidente.

Atuações

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

O trio Kirsten Dunst, Wagner Moura e Cailee Spaeny simplesmente carrega o filme nas costas. Os atores têm uma ótima química juntos e suas performances individuais trouxeram mais peso, naturalidade e vivacidade ao longa, cada um de uma forma. Enquanto Kirsten simbolizava as sequelas emocionais de uma guerra, carregando olhares pesados de esgotamento, Wagner representava uma incredulidade disfarçada de excitação, medo disfarçado de bom humor, e Cailee, pela sua falta de calejamento sobre a guerra, tem somente a oferecer suas habilidades fotográficas e o desejo de contribuir com algo relevante.

Inclusive, é muito triste e interessante a mudança de postura da Cailee à medida que mais eventos traumáticos — e comuns — da Guerra vão impactando a equipe. A atriz foi o coração de Guerra Civil e um artifício muito bacana foi sua contraposição de olhares.

Porém, há dois atores que foram os verdadeiros destaques: Jesse Plemons e Wagner Moura. O brasileiro deteve todas as cenas cômicas de Guerra Civil e, não contente com isso, protagonizou a cena mais dramática do filme, mostrando sua versatilidade. Já Plemons desempenhou o melhor trabalho cênico de sua carreira, colocando para fora seu lado sádico e entregando a cena mais enervante do longa.

O coletivo fez a força em Guerra Civil, o que não me espantaria uma lembrança na categoria inédita do Oscar 2025 de Melhor Elenco.

Fotografia, Direção de arte e Som

Junto com as atuações, outros pilares de sustentação foram a fotografia e a mixagem do som. Um filme de guerra obviamente tem como pré-requisito um forte trabalho combinado entre os três, mas Guerra Civil os une para contar uma história de forma inédita, com mais apelo à fotografia e direção de arte.

Quanto ao som, o trabalho realmente foi bem satisfatório e corroborou para a imersão do telespectador nos fronts de batalha. Contudo, o próprio longa deu a entender, no começo do filme, literalmente, com uma sacada de inserção de áudio mono em cada caixa de som do cinema, que a mixagem teria sua ambição, algo que não foi cumprido com originalidade.

Agora, eu não posso dizer o mesmo da direção de arte e fotografia, extremamente bem trabalhadas. A montagem incluindo fotos que são tiradas por Lee e Jessie — e a diferença criativa e visual nítida entre cada foto das personagens –, os ângulos de câmera que partem do ponto focal da câmera, recortes mais macros do ambiente em si tomado pelos horrores da guerra e as recorrentes contraposições entre a vida normal e os armamentos bélicos foram mais que bem-vindas, mas também um olhar rico de Alex Garland perante a narrativa e um novo jeito de contar a trama com palavras que não são ditas – e sim sentidas.

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Isso, na verdade, seria descrito ao decorrer da crítica, mas senti que deveria escrever uma seção específica sobre a direção de arte por uma informação que vasculhei pela internet: a equipe de Guerra Civil utilizou armamento real, com balas de festim, nas cenas de combate, incluindo uma montagem do zero de quarteirões de Washington D.C. em três semanas, pelo time de designers da Caty Maxey — estamos falando de edifícios, no plural mesmo, de 100 metros de altura.

A supervisão de coreografias, liderada pelo conselheiro militar Ray Mendoza, ex-membro da marinha dos Estados Unidos, foi a cereja desse bolo de comprometimento e excelência da equipe técnica, explicando o sabor prazeroso que as cenas de ação tiveram.

Um espaço importante ao jornalismo

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Com o tempo, o jornalismo desvinculou do estereótipo de “enxeridos”, “maldosos” e “influenciáveis” e ganhou grande protagonismo sobre sua função crucial para a sociedade. Cidadão Kane (1942), Zodíaco (2007), Spotilight – Segredos Revelados (2015) e The Post (2017) são alguns filmes incríveis que mostraram o árduo dia a dia dos jornalistas e repórteres frente a sua profissão e os desafios e ameaças que fazem parte do emaranhado.

Guerra Civil com certeza entra nesta lista de grandes obras sobre o jornalismo, mostrando uma faceta ocultada pelos grandes papéis dos apresentadores e repórteres: os fotojornalistas. A coragem, empenho e compromisso de um fotojornalista em transmitir a informação e, consequentemente, relatar uma história por meio de fotos, mostrando sua cara à tapa e entregando seu corpo e alma totalmente, é admirável. Num recorte mais sério sobre autoritarismo e massacres, os fotojornalistas arriscam suas vidas pelo ofício e pelo interesse público.

A ineditude da figura do fotojornalista no filme e a exposição do real dever do jornalismo pelo o que tá acontecendo no mundo fora dos nossos holofotes e olhares, de maneiras diferentes, faz Guerra Civil ser um filme emocionante para nós, profissionais da área. Mesmo ficando nas entrelinhas, o longa é uma carta de amor ao jornalismo, abalado pelo mercado e pela sociedade, por menosprezos, vaias, socos, chutes e por mortes — o Brasil, por exemplo, está na lista de países que mais matam jornalistas no ano, de acordo com relatórios da Reuters Institute e da ONG Repórteres Sem Fronteiras.

Por que sua trama é uma “advertência”?

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Além de Guerra Civil ser uma carta de amor ao jornalismo, o filme de Alex Garland representa o amor à democracia. O significado que o filme passa é sobre o quão perigosa a polarização política pode ser e como ela surge e ganha força por fora. Com a dissolução da Constituição, houve a dissolução da União e a privação de diversos direitos humanos, como o de ir e vir, e a permissão do obscurantismo tomando as rédeas de um país em estado de emergência e ordem.

Em premières, Wagner Moura foi muito necessário ao ponderar o quanto que os estadunidenses não valorizam a democracia e os parâmetros entre Brasil e Estados Unidos com o palanque para extremistas e os flertes que os dois países americanos tiveram recentemente — a Invasão do Capitólio em janeiro de 2021 e a Invasão à sede dos Três Poderes em Brasília, em 2023, todos por viés da extrema-direita. Embora “Guerra Civil” não atenda a nenhuma agenda partidária — por isso a escolha criativa de unir, em uma mesma frente, os Estados do Texas e Califórnia, conservador e progressista, respectivamente –, o recado é bem dado pelo poder de destruição que uma simples atitude ou fala pode concretizar no Estado.

Com o Brasil vindo com eleições municipais, os Estados Unidos com eleições presidenciais em outubro e mais outros 56 países distribuídos em caráter Legislativo e Executivo, Guerra Civil torna-se uma advertência sobre valorizarmos a Constituição e à ordem política, sem aberturas à discursos e comportamentos extremos que depreciem o Estado Democrático e seus equipamentos.

Conclusão: Guerra Civil é bom?

Cena de guerra civil. (foto: reprodução/a24/diamond films)
Cena de Guerra Civil. (Foto: Reprodução/A24/Diamond Films)

Guerra Civil não é uma “obra-prima moderna” como alguns críticos afirmaram, mas com certeza trata-se de um filme excelente e com um grande recado para ser ecoado. Para os fãs de ação, é um prato cheio; para os amantes de boas histórias, o longa dirigido e escrito por Alex Garland é muito interessante, embora o foco esteja centrado na apuração da guerra e, por cima disso, no desafio central dos fotojornalistas de entrevistarem o presidente. Caso esteja esperando mais explicações da Guerra, o filme não optou por esse caminho, o que é bom e ruim ao mesmo tempo.

As atuações estão viscerais, com Wagner Moura protagonizando todas as cenas e ganhando um destaque muito bacana e construtivo. O filme é lindo esteticamente, tanto por cenário quanto por edição e efeitos, e seu roteiro é bem coeso e dinâmico, sem aprofundamentos. Seu último ato é sufocante, mas previsível, de certa forma.

Onde assistir Guerra Civil

“Guerra Civil” estreará nos cinemas no Brasil, sob selo Diamond Films, no dia 18 de abril, permanecendo de 1 a 2 meses em cartaz, em média. O filme é produzido pela A24 e não tem ainda nenhum acordo de reprodução posterior em alguma plataforma de streaming.

Veja também:

Fonte: Rotten Tomatoes, IMDB, Terra

Revisão do texto feita por: Pedro Bomfim

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