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Explica para a Ministra Damares: quando meninas começaram a usar rosa?

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A cada geração, novas definições sobre masculinidade e feminilidade são trazidas à tona, manifestando-se inclusive nas roupas de meninos e meninas. Entenda como isso mudou ao longo dos tempos.

“Menino veste azul e menina veste rosa”. Esta frase tornou-se bastante comentada nos últimos dias graças a Ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves. Apesar de ser vista como apenas mais uma bobagem por grande parte das pessoas, a frase da Ministra Damares acaba levantando uma questão a ser pensada: afinal de contas, quando o rosa passou a ser considerado uma cor para meninas e azul para meninos?

A história nos mostra que as coisas nem sempre foram assim e, como em todo tipo de cultura, essas definições foi surgindo com o tempo, oriundas de uma realidade completamente diferente e movida pelo consumismo.

Meninos de vestidos

Quem se deparar hoje em dia com a foto do jovem Franklin Delano Roosevelt de apenas 2 anos e meio, datada de 1884, certamente estranharia alguns aspectos da imagem. O garoto, futuro 32º Presidente dos Estados Unidos,  está sentado em um tronco de madeira, segurando um chapéu com penas, cabelos loiros longos nos ombros e um vestido branco. Sim, um vestido. Branco. Para entender o contexto da foto, é preciso entender o contexto histórico da época.

Fotografia do pequeno franklin de 2 anos e meio em 1884
Fotografia do pequeno Franklin de 2 anos e meio em 1884

Em 1884, a convenção social ditava que garotos deveriam usar vestidos até os 6 anos de idade, que seria também quando eles deveriam ter o seu primeiro corte de cabelo. Ou seja, para a época, a foto era vista como absolutamente normal e aceitável. Então o que mudou?

Por que atualmente as pessoas precisam saber o sexo de um bebê ou de uma criança ao olhar para ela de cara? Esse é um assunto discutido no livro “Rosa e azul: Diferenciando as meninas dos meninos na América”, de Jo B. Paoletti. Como tivemos uma mudança tão drástica na forma de vestir as crianças em nosso tempo? Quando começou a surgir o time rosa e o time azul?

Jo, que vem estudando a história e o significado das roupas de crianças por 30 anos, afirma que durante séculos elas usaram branco até os 6 anos de idade:

“É na verdade uma história sobre o que aconteceu com o estilo neutro de roupas.  O que antes era uma questão de praticidade se tornou uma questão de ‘Oh meu Deus, se eu vestir o meu bebê de forma errada, ele vai crescer pervertido.”

Mas essa mudança toda não aconteceu de forma rápida e nem linear. As cores começaram a chegar para as crianças na metade do século 19, mas ainda assim não determinavam nada a respeito do gênero. Não até um pouco antes da Primeira Guerra Mundial, e mesmo nessa época ainda levou um tempo para que esse conceito se tornasse popular.

Azul já foi de meninas e rosa de meninos

Em 1918, rosa era considerada uma cor mais apropriada para meninos
Em 1918, rosa era considerada uma cor mais apropriada para meninos

Diferente da ideia defendida pela Ministra Damares, houve uma época em que os meninos eram vestidos com roupas rosas e meninas com roupas azuis. Em junho de 1918, o Departamento Infantil Earnshaw publicou que a regra era de que meninos usassem rosa e meninas azul.

Isso porque, segundo a mesma publicação, o rosa seria uma cor mais decidida e forte, ou seja, que combina mais com garotos. Enquanto isso, o azul seria uma cor mais delicada e caprichosa, o que combinaria mais com garotas.

É notável que até mesmo quando as cores trocam de lugar, as definições não mudam tanto. Em 1927 a revista Time publicou um uma cartilha afirmando que azul era para ser usado em meninas, e rosa em meninos, assim como a Filene em Boston, a Best & Co. em Nova York, Halle em Cleveland e Marshall Field em Chicago.

A ditadura de cores que foi proposta pela Ministra Damares só apareceu em meio aos anos 40, como resultado de uma preferência de compras na América, interpretada pelas lojas e fabricantes de roupas infantis da época. Dessa forma, as crianças começaram a ser criadas com essa ideia de que as roupas deveriam especificar seu gênero de alguma forma. Garotos eram vestidos como seus pais e meninas como suas mães.

Fruto do consumismo

Com a chegada do movimento libertário feminino, a ideia era vestir meninas com as mesmas roupas de meninos
Com a chegada do movimento libertário feminino, a ideia era vestir meninas com as mesmas roupas de meninos

Quando o movimento libertário das mulheres começou a surgir nos anos 60, a história mudou um pouco de figura. As mulheres que começavam a lutar pelos seus direitos, diferente da época de Franklin Roosevelt, apoiavam a ideia de que ao invés de um gênero neutro, as meninas deveriam ser vestidas como meninos. Essa seria uma forma de mostrar a elas que não estavam presas ao papel de mulheres subservientes por causa das suas roupas delicadas. Vestindo-as como garotos, elas se sentiriam menos frágeis e mais livres.

Foi em meados de 1985 que o gênero neutro começou a ser deixado definitivamente de lado e essas imposições de diferenças começaram a se tornar ainda mais abrangentes do que apenas cor de roupa. Nessa época, os quartos de meninos não eram apenas decorados de azul, mas começaram a surgir ursinhos segurando bola de futebol.

A divisão das cores passou a ser em relação a tudo, não apenas a roupa
A divisão das cores passou a ser em relação a tudo, não apenas a roupa

Um dos grandes motivos para essa chegada e essa mudança de convenção social a respeito dos bebês foi a evolução do teste pré-natal e a capacidade de descobrir o sexo antes do nascimento. Dessa forma, os pais já começavam a comprar coisas para os seus futuros bebês e o mercado aprendeu a se aproveitar disso da melhor forma. Afinal de contas, quanto mais individualizada for essa compra, mais eles vão gastar, certo? E se por um acaso tivessem mais um filho, teriam que gastar tudo de novo principalmente se o sexo fosse diferente.

Até mesmo as mães que foram criadas antes dos anos 80 acabaram aderindo a esse tipo de consumo. Apesar de crescerem em uma cultura de gênero neutro ou até mesmo que ditava valores diferentes, elas simplesmente aceitaram que suas filhas poderiam ser fortes e independentes, mas ainda assim “femininas”, e por isso o rosa.

E qual é o impacto nas crianças?

Crianças. A cor importa?
Crianças. A cor importa?

Essa mudança de convenção social também acaba tendo impacto nas próprias crianças e a forma como elas enxergam toda essa situação. De acordo com especialistas, as crianças não são cientes dos seus gêneros até ter entre 3 ou 4 anos, ou seja, até essa idade não importa realmente para elas se são meninas ou meninos. E, é só até cerca de 6 ou 7 anos que elas entendem que isso é definitivo.

Porém, hoje em dia, elas estão sendo submetidas a propagandas e frases como a da Ministra Damares, que acabam forçando essas convenções em suas cabeças. E por isso eles começam a acreditar, por exemplo, que o que faz alguém ser feminina é ter cabelo longo e usar vestido. E isso acaba se tornando um conflito novo e desnecessário quando uma dessas crianças simplesmente não se sente confortável com o que lhe é imposto. Pais devem deixar que seus filhos se expressem livremente ou devem prendê-los ao que a sociedade faz acreditar que é o certo?

A infelicidade da Ministra Damares

Ministra damares. "azul é cor de menino"
Ministra Damares. “Azul é cor de menino”

Como é possível perceber, existem diversas provas históricas e culturais que mostram o quanto a frase “Menino veste azul e menina veste rosa” é apenas uma herança ultrapassada. Esse conhecimento é mais acessível atualmente, e as pessoas estão se tornando cada vez mais conscientes do quanto precisam “quebrar” certas convenções sociais.

A repercussão da frase da ministra e a comoção que causou é uma prova viva disso. Muitos de nós temos agora discernimento para avaliar melhor questões como essa, e nossas crianças agradecem.

E você? O que achou do comentário da Ministra? Deixe sua opinião nos campos abaixo.

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